Por que ler Machado de Assis – contos e romances insuperáveis

Machado de Assis nasceu gago, pobre e epilético. Não conseguiu frequentar regularmente a escola. Estudou por sua conta, lendo tudo o que lhe interessava – que era, bem, quase tudo. Graças a seu talento e a uma enorme força de vontade, superou todas essas dificuldades e tornou-se um dos maiores escritores brasileiros de todos os tempos.

Biografia de Machado de Assis

Joaquim Maria Machado de Assis, o Machado de Assis, nasceu no dia 21 de junho de 1839 no bairro de Cosme Velho, no Rio de Janeiro. Seu pai era o mulato Francisco José de Assis, pintor de paredes e filho de escravos alforriados, e sua mãe era Maria Leopoldina Machado, uma portuguesa da Ilha de São Miguel, nos Açores.

Quando criança, Machado vivia em uma chácara no Rio de Janeiro, então uma cidade pacata, de costumes ainda bem ligados aos europeus. Esse cenário, quase interiorano, foi o ambiente histórico de quase toda sua obra, reconhecida em todo o mundo.

Estreou na literatura aos quinze anos, com poemas. Ainda jovem, aprendeu francês e inglês. Mais tarde, traduziu grandes obras desses idiomas, como Os trabalhadores do mar, de Victor Hugo, e O corvo, de Edgar Allan Poe.

Trabalhou como aprendiz de tipógrafo na Imprensa Oficial com o romancista Manuel Antônio de Almeida, com quem travou contato e cuja influência foi importante no início de sua carreira como escritor. Com pouco mais de vinte anos de idade, Machado de Assis começou a trabalhar como redator de jornal e a colaborar para uma série de veículos de imprensa: Correio Mercantil, Diário do Rio de Janeiro, O Espelho, etc. Também nessa época tomou contato com escritores como Gonçalves Dias e José de Alencar.

Jovem Machado em 1964.
Jovem Machado de Assis em 1964.

Na década de 1870, Machado publicou poemas e livros de contos que tiveram sucesso de público e crítica. Nesta época, na sua chamada primeira fase, Machado ainda era ligado à literatura romântica, e publicou os romances Ressurreição (1872) A Mão e a Luva (1874) Helena (1876) e Iaiá Garcia (1878).

Na década de 1880, Machado viveu o que podemos chamar de inflexão criativa, em estilo e conteúdo, inaugurando o Realismo na literatura brasileira. Os romances Memórias póstumas de Brás Cubas (1881); Quincas Borba (1891), Dom Casmurro (1899) e os contos Papéis avulsos (1882); Histórias sem data (1884), Várias histórias (1896) e Páginas recolhidas (1899), entre outros, foram publicados nessa época. O espírito crítico, a grande ironia, o pessimismo e uma profunda reflexão sobre a sociedade brasileira então se estabelecem como as suas marcas mais características.

Em 1897, Machado fundou a Academia Brasileira de Letras, da qual foi o primeiro presidente, pelo que a instituição também conhecida como casa de Machado de Assis. Ocupou a Cadeira N.º 23, de cujo patrono, José de Alencar, foi amigo e admirador.

Machado viveu sozinho durante muito tempo. Mas quando se casou, o fez com toda convicção, em 12 de novembro de 1869, com a portuguesa Carolina Augusta Xavier de Novais. Essa união durou cerca de 35 anos e casal não teve filhos. Quando Carolina morreu, em 1904, Machado ficou profundamente abalado. Morreria 4 anos depois, em setembro de 1908, no mesmo bairro onde nasceu, Cosme Velho.

Machado de Assis, embora tenha sido um intelectual de grande articulação justo a instituições e a diversas esferas da sociedade, quase não viajou. O escritor abandonou sua cidade natal uma única vez, em viagem à Friburgo. Mas pelos livros, ele conheceu o mundo inteiro.

Marc Ferrez/ Coleção Gilberto Ferrez/ Acervo Instituto Moreira Salles. Avenida Central na altura da Rua do Ouvidor, com rua Miguel Couto, Rio de Janeiro, c. 1906. Negativo de Vidro
O Rio de Janeiro na época de Machado. Avenida Central na altura da Rua do Ouvidor, com rua Miguel Couto, Rio de Janeiro, c. 1906. – Marc Ferrez/ Coleção Gilberto Ferrez/ Acervo Instituto Moreira Salles.

Estilo único

De forma estrita, é impossível rotular Machado de Assis em apenas uma corrente literária. O estilo de Machado é único, e vários críticos literários tentaram descrevê-lo desde 1897 – de fato, suas obras têm sido estudadas por críticos de vários países do mundo. É considerado por muitos o maior escritor brasileiro de todos os tempos e um dos maiores romancistas e contistas do mundo.

Machado gostava de tratar sobre máscaras sociais, universo feminino, poder, instituições, ascensão social, ciúme, entre outros. A narração de Machado é sempre indireta, assim como qualquer mensagem moral ou política. A crítica social é implícita, até mesmo encantadora; Machado nunca foi um fanático ou um pregador.

Frequentemente a cidade do Rio de Janeiro se mistura à sua ficção. A vida social ali ainda girava em torno da Corte, mesmo com a ascensão constante dos ideais republicanos.

Os contos de Machado – domínio técnico e olhar inigualável

Os contos ocupam um papel de grande importância na obra de Machado de Assis. Dentre suas principais obras do gênero, destacam-se Contos fluminenses (1870), Histórias da meia-noite (1873) e Papéis avulsos (1882), que inclui alguns de seus contos mais famosos, como ” O alienista”, “Teoria do medalhão” e “O espelho”. Em Papéis avulsos, Machado inaugura uma nova perspectiva estilística e uma nova visão da realidade, mais complexa e diversificada; além dos temas básicos que sempre o interessaram, vemos um tema que seria central em sua obra a partir daí: a loucura.

A partir dela, Machado de Assis consegue tratar e jogar com as ambiguidades que marcam a cultura brasileira: a constante oscilação entre regra e exceção, verdade e representação, simulação e o real, fato e fake news… e assim produz uma interpretação do Brasil relevante ainda hoje, aqui e em todo o planeta. – não só pela fina análise de Machado mas também pelo seu pleno domínio da técnica de narrar histórias curtas.

São contos que merecem ser lidos pela excelente percepção das qualidades e falhas humanas. É impressionante como neles, Machado de Assis, um homem do século 19, escreveu coisas tão contemporâneas, que falam conosco até hoje. Agradável, divertida, encantadora, bem-humorada, às vezes séria… a obra de Machado permanece imperdível mesmo séculos depois de sua criação – que é a definição de um clássico.

Diálogo com a Bíblia na obra de Machado

A Bíblia tem um conteúdo impressionante que tem sido fonte para o mundo da literatura há séculos, servindo muitas vezes de alicerce para algumas das obras mais brilhantes de diversos autores. Tornar-se leitores da Bíblia e se apoderar de seu conteúdo que fala à alma não necessariamente os faz pessoas que professam a mesma fé. Esses autores, entretanto, se conectaram aos livros da Bíblia, à sua força poética, e ao enredo da história humana e divina. 

A Bíblia transcende o seu tempo. Num tempo em que somente heróis e deuses eram descritos na literatura, a Bíblia nos apresenta homens e mulheres genuínos, com defeitos e transformações. Deus é apresentado com graça e perfeições que desafiarão poetas, escritores, filósofos e toda área de conhecimento humano.

No romance Esaú e Jacó (1904) Machado de Assis dialoga com a Bíblia sem necessariamente se submeter à ela. Como uma mera descrição, ele cria uma tessitura que convida o leitor a ter conhecimentos para valorização de sua obra. As analogias são criadas a partir daí.

Embora Esaú e Jacó não seja uma obra de cunho religioso, a recorrência bíblica e o mito do duplo estão presentes ao longo de todo o enredo. O próprio nome do romance, Esaú e Jacó, empresta os nomes e histórias da narração bíblica dos irmãos gêmeos Esaú e Jacó, registrados no livro de Gênesis. ‘Esaú e Jacó’ têm outros nomes no romance, respectivamente Pedro e Paulo (os quais, na história bíblica, também viveram conflitos que serão resolvidos).

O sobrenatural desta vez não é como nas Escrituras, mas se demonstra através da adivinha Cabocla. Entretanto Pedro e Paulo se apaixonarão pela mesma mulher, chamada Flora, que morrerá sem decidir-se com qual se tornará noiva e se casará. Os filhos de Natividade e Santos se tornarão deputados de partidos opostos: um defenderá a monarquia e o outro a República. Desta forma, eles lutaram em lados opostos desde o nascimento até o fim de suas histórias.

A obra de Machado de Assis

ROMANCES

Ressurreição (1872); A Mão e a Luva (1874); Helena (1876); Iaiá Garcia (1878); Memórias Póstumas de Brás Cubas (1881); Quincas Borba (1891); Dom Casmurro (1899); Esaú e Jacó (1904); Memorial de Aires (1908).

CONTOS

Contos Fluminenses (1870); Histórias da Meia-Noite (1873); Papéis Avulsos (1882); Histórias sem Data (1884); Várias Histórias (1896); Páginas Recolhidas (1899); Relíquias da Casa Velha (1906).

POESIA

Crisálidas (1864); Falenas (1870); Americanas (1875), Poesias Completas (1901).

TEATRO

Desencantos (1861); Quase Ministro (1862); O Caminho da Porta (1863); O Protocolo (1863); Deuses de Casaca (1866); Tu, Só Tu, Puro Amor (1881); Não Consultes Médico (1896); Lição de Botânica (1906).

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Referências:
Prefácio de Rodrigo Petronio e Luiz Fernando Ribeiro Alvarenga no livro Várias Histórias, de Machado de Assis.

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