Por que ler Clarice Lispector: 100 anos da escritora tão cult quanto pop

Clarice Lispector, um dos maiores nomes da literatura brasileira, reconhecida mundialmente por seus romances inovadores e autênticos, que traziam toda a sagacidade da autora, celebra em dezembro seus 100 anos. Um aniversário simbólico para uma Clarice que já se foi, porém ainda vive no imaginário literário do País.

Para celebrar seus 100 anos, saiba mais a respeito de Clarice Lispector, da importância de suas obras e seu trabalho.

Clarice Lispector: a biografia

Chaya Pinkhasovna Lispector ou, como ficou conhecida, Clarice Lispector nasceu na aldeia de Tchetchelnik, na Ucrânia, no dia 10 de dezembro de 1920. A jovem ucraniana veio para o Brasil com seus pais, Pinkouss e Mania Lispector um casal judeu, que fugiram da perseguição aos judeus durante a Guerra Civil Russa.

No Brasil, Clarice Lispector e seus pais fixaram moradia em Maceió, Alagoas, onde morava a irmã de sua mãe, Zaina. No novo país, a família decidiu mudar de nome para se proteger de possíveis perseguições. Assim Chaya Lispector se torna Clarice, a autora que conhecemos.

Após alguns meses, a família Lispector se muda para o Recife, onde Clarice passou sua infância. Durante seus primeiros anos ali aprendeu a ler e escrever, e já a partir desse momento a jovem começou a elaborar pequenos contos. Quando mais velha, foi aluna no grupo escolar de João Barbalho, completando o primário. Aprendeu a falar e escrever em francês e inglês, além de aprender iídiche com seus pais.

Aos 12 anos, se muda para o Rio de Janeiro com toda sua família, que se instalam no bairro da Barra da Tijuca. Na cidade, Clarice Lispector estudou no Colégio Sílvio Leite, onde completou o ginásio. Desde muito jovem, a autora lia e escrevia com frequência, sendo a biblioteca um de seus lugares favoritos nas escolas onde passou.

Clarice Lispector ingressou na Faculdade de Direito da Universidade Federal do Rio de Janeiro em 1941, enquanto trabalhava como secretária em um escritório de advocacia e também com traduções de textos. Esse período foi tumultuado para a família Lispector, pois com a movimentação da Alemanha Nazista na Europa e o Governo de Getúlio Vargas, o antissemitismo se tornou algo forte no Brasil. O pai de Clarice, na época, arrecadava dinheiro para judeus.

Após ingressar na faculdade, Clarice Lispector começou a trabalhar na Agência Nacional como redatora. Algum tempo depois foi trabalhar para o jornal A Noite. Em 1943, aos 23 anos, a jovem se casa com Maury Gurgel Valente e no ano seguinte se forma em direito.

Clarice Lispector é um dos ícones da literatura brasielira.
Clarice Lispector é um dos ícones da literatura brasileira. |Foto: Reprodução.

Com o término da faculdade de direito, Clarice escreve e publica seu primeiro livro em 1944. A obra Perto do Coração Selvagem, retrata uma visão interiorizada do mundo da adolescência e iniciou uma nova tendência na literatura brasileira. O romance espantou críticos e o público da época. Sua narrativa quebra a sequência de começo, meio e fim, assim como a ordem cronológica, e funde a prosa à poesia. No mesmo ano, o livro recebeu o Prêmio Graça Aranha.

Seu marido, Maury Gurgel, era diplomata, o que permitiu Clarice viajar por diversos países em sua companhia. Em sua primeira viagem para fora do Brasil, foi para a Itália e lá ajudou como voluntária a equipe de enfermeiras do hospital da Força Expedicionária Brasileira.

Em 1946, a autora publicou O Lustre, na época Clarice Lispector morava em Berna, na Suíça. Em 1949 teve seu primeiro filho, Pedro, e publicou seu terceiro livro, A Cidade Sitiada. Após o nascimento de Pedro, Lispector se dedica a escrever contos e em 1952 publicou Alguns Contos, uma pequena coletânea.

Em 1954, seu segundo filho, Paulo, nasce e sua primeira obra é publicada em francês. Na época, Clarice e sua família estavam morando nos Estados Unidos. 5 anos após o nascimento de seu segundo filho, a autora se separa de seu marido e retorna com as crianças para o Rio de Janeiro. Ao voltar a cidade, Lispector foi escrever novamente em jornais, no Correio da Manhã ela publicava a coluna “Correio Feminino”.

Nos anos seguintes ela publicou Laços de Família e O Mistério do Coelhinho Pensante, que receberam diversos prêmios e foram elogiados pela crítica.

Em 1967, Clarice Lispector sofre um acidente, após dormir com um cigarro aceso. A escritora queimou diversas partes das mãos e passou por muitas cirurgias para ajudar em sua recuperação.

Em 1977, 10 anos após o acidente que sofreu, publicou sua última obra e, talvez, uma das mais populares entres seus livros. A Hora da Estrela conta a história de Macabea, uma moça do interior que busca sobreviver na cidade grande.

Clarice Lispector faleceu no dia 09 de dezembro de 1977, um dia antes de seu aniversário de 57 anos, em decorrência de um câncer nos ovários. Antes de falecer, a autora integrou o Conselho Consultivo do Instituto Nacional do Livro.

Clarice Lispector se formou em direito e trabalhou em jornais no Rio de Janeiro. | Foto: Reprodução.

As obras de sua vida

Clarice Lispector escreveu 8 romances, uma novela, 7 contos, 5 livros infantis, 2 crônicas, além de entrevistas, artigos, entre outros. Sua obra literária e extensa e repleta de clássicos da literatura brasileira. Uma das poucas mulheres que se destacaram no mundo literário no Brasil.

Seus livros são conhecidos por seu estilo poético e metafórico, no qual Clarice Lispector brincava com as palavras e seus significados. Além disso, a acidez de seus livros e a sinceridade com a qual a autora encarava o mundo tornaram seus romances, contos e novelas únicas.

Clarice criou uma nova maneira de escrever que foi comparada a autoras como Virgínia Woolf e James Joyce, que trabalhavam com histórias complexas e narrativas desconstruídas. Lispector inovou na literatura ao inovar na escrita, quebrando regras de pontuação, criando sua própria maneira de pontuar, acentuar e escrever o português, inglês, francês e qualquer outra língua que veio a dominar.

É essa quebra do conhecido que torna a autora amada por muitos, mas ao mesmo tempo, criticada por tantos outros. Suas obras escritas em camadas são complexas e precisam de um olhar mais aguçado para a compreensão das nuances trabalhadas por Clarice Lispector.

Assim como Orlando, personagem criado por Virgínia Woolf, que possui uma complexidade em sua personalidade e história, que muito confundiu quando foi publicado, as personagens de Clarice despertam o mesmo. Da mesma maneira que Woolf fez sucesso com Orlando, porém criou diversas discussões, Lispector traz a mesma ideia com Macabea. Uma personagem que mexe com o imaginário brasileiro tão conhecido de obras como Vidas Secas, de Graciliano Ramos, o nordestino e sua vida. Porém com uma construção única, de alguém que está apenas buscando viver fora do ambiente no qual é pensado.

Ler Clarice Lispector é ter que ler entre as linhas de suas histórias e compreender os detalhes sinceros, acidez e metafóricos introduzidos na narrativa.

Clarice Lispector e a interioridade de seus personagens

O site coladaweb faz um interessante comentário sobre a interioridade dos personagens de Clarice Lispector:

“Em se tratando da literatura de Clarice Lispector, nem sempre se pode falar em narrativa. Há textos seus em que a interação psicológica é tão intensa, tão dominadora, que é comum não se poder falar em narrativa, em enredo.”

“A realidade imediata dada pelo exercício exato dos sentidos ou pela razão acaba perdendo os contornos em seus textos. A grandeza e o significado de suas personagens extrapolam a mesmice, a monotonia da vida e se transformam, solidamente, em símiles através de antíteses e paradoxos; as ambiguidades, as sutilezas ponteiam sua obra: o eu e o não eu, o ser e o não ser. Entre outras características de sua prosa, destacam-se:

inadaptação dos personagens: seus personagens não se mostram adaptados ao mundo moderno, que os despersonaliza e os toma comuns;

aproximação de vozes: a voz do narrador e as vozes dos personagens se aproximam, tomando cada vez menos definida a fronteira que as divide. A técnica usada é a do fluxo de consciência;

interiorização narrativa: a narrativa não é mais baseada em acontecimentos dispostos em ordem cronológica Ao contrário, ela é centrada na interioridade e no inconsciente do personagem, em suas angústias e fraquezas;

epifania: característica fundamental da narrativa clariceana, a epifania representa o momento de “iluminação” a partir do qual é operada uma transformação interior no personagem.”

Personagens profundas

Eli Moreira também destaca a profundidade da vida interior dos personagens da autora:

“Ler Clarice é ler o que os personagens sentem e sofrem no desassossego de sua alma. A alma está presente no trabalho de Lispector, a incompletude, a crítica mordaz a continuação de uma atuação social que não reflete as crises, os medos e os verdadeiros sentimentos de seus personagens que espelham a vida em sociedade e a procura por sentido e por verdade. Esta também deverá ser a procura de quem deseja andar com Deus e viver uma vida coerente que mostre a felicidade como uma vida coesa com Deus e consigo próprio. Crer é também pensar!”

clarice-lispector
“O amor é a única coisa que não precisa ser compreendida.”

Lista de obras de Clarice Lispector

Romance:

  • Perto do Coração Selvagem (1943)
  • O Lustre (1946)
  • A Cidade Sitiada (1949)
  • A Maçã no Escuro (1961)
  • A Paixão segundo G.H. (1964)
  • Uma Aprendizagem ou O Livro dos Prazeres (1969)
  • Água Viva (1973)
  • Um Sopro de Vida (1978)

Contos:

  • Laços de Família (1960)
  • A Legião Estrangeira (1964)
  • Felicidade Clandestina (1971)
  • Onde Estivestes de Noite (1974)
  • A Via Crucis do Corpo (1974)
  • O Ovo e a Galinha (1977)
  • A Bela e a Fera (1979)

Novela:

  • A Hora da Estrela (1977)

Literatura Infantil:

  • O Mistério do Coelho Pensante (1967)
  • A Mulher que Matou os Peixes (1968)
  • A Vida Íntima de Laura (1974)
  • Quase de Verdade (1978)
  • Como Nasceram as Estrelas (1987)

Crônicas:

  • Para Não Esquecer (1978)
  • A Descoberta do Mundo (1984)

Entrevistas:

  • Entrevistas (2007)

Artigos de jornais:

  • Outros Escritos (2005)
  • Correio Feminino (2006)
  • Só para Mulheres (2006)

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