O Supernova Cultura é uma ONG criada por Eli Moreira para realizar iniciativas de projetos sociais utilizando as ferramentas da arte e cultura.
Em 2019, a ONG Supernova Cultura lançou o projeto “Música na Escola” na Escola Estadual Prof. Orlando Mendes de Moraes, localizada próximo ao Parque Ecológico do Guarapiranga, na altura do nº 8700 da Estrada do M’Boi Mirim, uma região mais afastada do Jd. Ângela, um bairro periférico na cidade de São Paulo.
A escola atende predominantemente alunos dos bairros Pq. Cerejeiras, Jd. Vera Cruz e Jd. Horizonte Azul, cujos índices de IDH são inferiores à média da administração do Jd. Ângela (0,750), já o quarto menor índice da cidade de São Paulo.
Desenvolvemos oficinas na escola para três modalidades de instrumentos: Violão, Violino e Percussão (com foco em instrumentos de Bateria no estilo de Escola de Samba). Para garantir que os alunos não perdessem suas atividades curriculares, as aulas foram ministradas no contraturno, ou seja, pela manhã para os alunos da tarde e à tarde para os alunos da manhã.
A adesão dos alunos foi surpreendente. “Os alunos gostaram mesmo, compraram a ideia”, conta Kerly, vice-diretora da escola. “As aulas de futebol e educação física, que geralmente são as que os alunos mais gostam, também eram oferecidas no contraturno e não tiveram a adesão que a Escola de Música teve. Os alunos chegavam mais cedo ou ficavam até mais tarde só para ver as aulas. Até alguns professores assistiram às aulas também.”
Cerca de 100 alunos fizeram as aulas, que foram oferecidas durante três meses de 2019. O ponto culminante da primeira turma foi a apresentação para toda a escola. Um vislumbre desse dia está disponível no vídeo abaixo.
INSTRUÇÃO PARA VIDA
As aulas eram ministradas por profissionais da música que também eram educadores. Isso permitiu uma abordagem educacional conjunta, em que os professores de música puderam conversar com os alunos a respeito de caminhos e decisões de vida que os alunos terão no seu futuro próximo e até mesmo para o restante de sua vida. Esse é o “Instrução para a Vida”, uma conversa franca e intencional oferecida nas aulas de música, que visa identificar as peculiaridades de cada indivíduo (seus contextos, medos, sonhos, etc.) e os faz construir uma orientação objetiva para se guiar pela vida.
Em qualquer conversa o ouvir é tão ou mais importante que o falar, e foi como uma Ouvidoria que o Instrução para a Vida trabalhou, ouvindo os alunos em suas angústias e os guiando a se conhecer, e ao mesmo tempo proporcionando diretrizes para a sua caminhada pela vida.
Em uma dessas aulas aplicamos um exercício de imaginação para os alunos, com as seguintes perguntas: “O que você quer para a sua vida daqui a um ano? E daqui a três anos? E daqui a 10 anos?”
Pela nossa análise das respostas, notamos que não havia uma sequência lógica e natural de uma resposta para outra ao longo dos anos, o que dava a respostas comuns como “quero morar fora do Brasil”, “quero ser jogador de futebol”, “quero ser famoso”, etc, um tom de desejo etéreo e distante.
Já quando fizemos as perguntas sobre o que eles NÃO queriam para vida deles nos próximos anos, as respostas eram muito mais próximas, urgentes e concretas: “não quero ser mãe”, “não quero ser pai”, “não quero que a minha mãe morra”, etc. Isso revela algumas das dificuldades enfrentadas nessa comunidade: sexualidade precoce, violência e condições precárias de saúde.
Para ter acesso a pesquisa completa, mande um email para eli@creari.com.br
TRANSFORMAÇÃO GERADA
A escola foi reconhecida em um evento em 2019 que celebrava boas práticas educacionais na Zona Sul de São Paulo. Após a apresentação de percussão nesse evento, realizado no CEU, o professor de matemática Vagner fez uma pergunta inspiradora aos alunos participantes do projeto: “Vocês percebem o que conseguiram aqui hoje?”. Os estudantes, um pouco surpresos, não souberam responder, ao que Vagner ressaltou: “Vocês colocaram nossa escola no mapa!”.
Um exemplo da transformação proporcionada pela Escola de Música na E.E. Orlando Mendes de Moraes foi o caso de Lucas, aluno do ensino médio que, em 2019, fez aulas de percussão. Antes um estudante indisciplinado e com muitas faltas, Lucas tornou-se outro após as aulas, obtendo melhores notas, diminuindo as ausências e melhorando significativamente seu comportamento na escola.
“É como se ele tivesse passado a valorizar a escola, a sala, o prédio”, comenta a vice-diretora Kerly. “Ele se dedicou nas aulas de percussão e isso mudou sua dedicação em sala de aula. Eu mesma fui professora dele no fundamental e quase não acreditei quando vi a mudança de comportamento. Agora ele vive me perguntando nos corredores quando retornam as aulas de música.”
Doação de Alimentos com Apoio da UBS J. Aracati
Instalados no bairro, com a chegada da pandemia em 2020, não pudemos ignorar as dificuldades da população local, inclusive dos familiares das crianças atendidas pela Escola de Música. Naquele ano, arrecadamos cerca de 5 toneladas de mantimentos para distribuição às famílias necessitadas nas regiões mais afastadas do Jd. Ângela, onde muitas vezes nem asfalto havia.
Para isso, nos aliamos à equipe da UBS J. Aracati, sob a gestão da Dra. Viviane, e com o auxílio dos agentes comunitários de saúde (ACS) chegamos às residências mais carentes.
Nessa ocasião, nos deparamos com a dimensão da vulnerabilidade naquele bairro – deficientes visuais morando sozinhos, idosos em condições de semi-abandono, crianças sem vacinação regular, entre tantos outros casos rotineiramente atendidos pelos ACS. E, sobretudo, muitos desempregados.
Por isso, um de nossos planos é criar um centro de capacitação no bairro, com cursos de costura, alvenaria, panificação, marcenaria, informática, entre muitos outros, de modo que possamos gerar um impacto positivo na comunidade também por meio da educação e da capacitação para o trabalho.
A E.E. Orlando Mendes de Moraes Precisa de Ajuda
A E.E. Orlando Mendes de Moraes necessita de apoio agora mais do que nunca. Em uma de nossas últimas visitas, havia apenas uma funcionária em todo o prédio – uma cozinheira que, sozinha, preparava alimentação para 600 alunos de manhã e mais 600 à tarde. Não existia sequer profissional de limpeza ou manutenção. Ainda assim, a escola estava arrumada e organizada, graças aos esforços imensos de professores e da direção/coordenação.
“Toda ajuda é muito bem-vinda”, afirmou Rita, diretora da escola. “É muito difícil, mas resistimos aqui, no chão da escola, como podemos, por amor à educação e por essas crianças. Sem educação, que chance elas têm?”